Nada como um bom Petisco Saloio
Durante séculos, a região saloia, graças aos seus férteis campos de cultivo, abasteceu Lisboa e arredores de legumes, fruta, animais de criação e produtos transformados como queijo e pão.
Chegavam à capital pelas mãos dos agricultores que os produziam e vendiam, depois de muitos quilómetros a pé e com ajuda de animais de carga.
Saloio é a designação desses habitantes naturais das zonas rurais do termo de Lisboa aquando da sua incorporação no Reino de Portugal, logo desenvolvendo uma cultura própria. “Çalaio” ou “çaloio”, termo que poderá estar na origem do nome, era o tributo que se pagava do pão cozido na corte e Patriarcado de Lisboa.
Não admira, que a fama desse pão delicioso, então cozido em fornos de lenha, tenha gerado importantes Çalaios, fundamentais para consagração e implementação do aludido pão na nossa Gastronomia regional, reconhecido que é pelo seu sabor adocicado, de miolo macio e crosta pouco rija.
Atualmente a região saloia está bastante descaracterizada, tendo alguns concelhos deixado a ruralidade do passado tornando-se zonas urbanas, como Amadora, Odivelas e partes significativas de Loures, Sintra, Mafra e Torres Vedras.
As tradições e formas de vida tradicionais perderam-se no passado recente e os atuais saloios (principalmente as novas gerações) em nada se distinguem dos lisboetas, nem dos habitantes de Oeiras e Cascais.
Aqui em Lisboa no Petisco Saloio, uma verdadeira embaixada da região Saloia, estabelecimento escolhido para mais um dos inúmeros jantares de natal de colegas e amigos que participei, ficamos todos entusiasmados, quando, vimos chegar o típico saquinho com pão e broa de milho, as azeitonas galegas marinadas, as manteigas em semiesferas com barriga de porco fumada, e um queijo de vaca gratinado com orégãos que combinavam muito bem com aqueles hidratos. Entradas que foram um prenúncio dos peticos saloios que vinham a seguir.
No nosso menu, para aquela que poderia ter sido uma última ceia (13 convivas), vieram uns Ovos Rotos com farinheira, estrelados na perfeição dando-lhes um excelente cremosidade; uns croquetes de alheira com “topping” de puré de maçã assada, acompanhados de batatas caseiras com um pouco de casca, bem estaladiças e ervas a aromatizar.
Depois, chegaram os moluscos à mesa, o Choco Frito bem crocante; um divinal polvo com pós de enchidos numa inigualável conjugação de sabores mar/terra; e uns camarões cozidos no vapor de textura exemplar, onde emanava o sabor da maresia no meio de alhos e pimentos.
Fiquei especialmente agradado com os petiscos/pratos de Carne. Magnifica aquela empada de rabo de boi, bem acompanhada pela mítica Pera Rocha cozida, um dos Ex Libris da região Oeste.
Que deliciosas estavam aquelas bochechas de Porco estufadas, secundadas por uma pequena porção de Xerém de Camarão, que gerou uma combinação tão improvável como inusitada. por fim um Pica Pau de novilho com picles com elevado equilíbrio de sabores e com uma Carne muito tenra, cheia de qualidade.
A escolha vínica, recaiu numa Qta. Termos DOC Beira Interior, de cor Rubi, aroma a frutos vermelhos, um travo que me pareceu ser de ameixa e um intenso sabor resultante do estágio em barricas de carvalho francês.
A apoteose doce aconteceu, e essa ficou a cargo de um bolo de chocolate cremoso, gelado de limão e granizado de frutos vermelhos, numa trilogia de sabores e texturas perfeitas.
No primeiro contato com o Restaurante, não se deixem influenciar pelo tamanho do mesmo.
Num pequeno espaço são feitos grandes petiscos. Salvo melhor opinião, estamos perante um dos espaços mais interessantes para partilhar uma refeição com amigos, ali na zona do Campo Pequeno – Lisboa.
Não podia fechar esta crónica sem enaltecer, a simpatia e especialmente a excelência da confeção e apresentação dos pratos, onde sobressai a escola do Diogo e do Carlos, que depois de formados, trocaram a alta cozinha de autor, por uma verdadeira “cozinha da Avó” com umas saudáveis e simpáticas rosáceas.
Endereço: Av. Barbosa Du Bocage 38,
1000-072 Lisboa
Nota : Convém ligar a reservar